sábado, 27 de setembro de 2008

O que ensinar a ele/a









Amar

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Agora o assunto é sério


Na verdade, são dois assuntos muito sérios. Capaz de fazer o papai aqui sair do sério. O suficiente para me manter de péssimo humor para o resto da vida: futebol e música. Tudo bem, quem me conhece sabe que eu não sou tão intolerante assim. Mas abuso tem limite. Sou botafoguense. Daqueles que ficam nervosos o suficiente para não assistir a nenhum jogo. Por outro lado, calmo demais para não aceitar provocações e gozações. Só tem um problema: apesar da minha alma gêmea, meu sogro e dois cunhados meus serem flamenguistas, eu ficaria bastante chateado se meu pimpolho escolhesse torcer para o urubu. É uma questão de caráter.

Não que a flamengada seja sem caráter. Mas simplesmente porque torcer para um time por qual qualquer um torce fala pouco sobre a personalidade de uma pessoa. Tudo bem, não vou fazer força para ele/a seja botafoguense. Na boa, também ninguém merece sofrer também (ah, ah, ah). Sei lá, tem tanto time aí. Também não seria bom se fosse torcedor do vasquinho ou do fluzinho. Não quero ficar freqüentando estádios da Série B (ah, ah, ah, de novo...).

Mas vamos ao assunto que realmente importa: música. Consigo ir a uma formatura ou a um casamento e dançar um funk ou um forró. De boa. Mas meu humor não resiste a um sertanejo-brega ou axé music. Não dá. Quem me conhece também sabe que tenho alergia a coisas tipo Maurício Manieri e Jorge Vercilo (Meu Deus, já comecei a me coçar...). Vou fazer minha parte. Apresentarei Beatles, Stones, Led, Creedence, Legião (para desespero da Lindona), Pato Fu (para desespero do Felipe).

Mesmo assim, convenhamos, o mundo de hoje é cheio de drogas. Musicais, claro. Meu amigo Otto já ajudou me presenteando com um Beatles For Babies. Espero que meus companheiros e companheiras não me deixem só nessa luta. Nesse caso, Deus me perdoe pelo o que eu vou escrever, mas se for para ele/a gostar desses lixos musicais, é preferível ser flamenguista...

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

O tamanho do problema e o problema do tamanho


Adoro apelidos. Já cheguei a criar um para mim, mas não deu certo. Desde que não sejam apelidos apelativos, acho muito divertido.

Aliás, descobri que a gente nem nasce direito e já recebe apelidos. Quando está dentro da barriga, já que não dá para ver como é a nossa aparência, se tem bafo, chulé ou sardas, o negócio é fazer comparações com o tamanho. Foi assim com o meu filhote. Primeiro, era do tamanho de uma cabeça de alfinete. Pronto, a gente começou a chamar a prole de Cabecinha. Com todo carinho, é claro. Depois, na primeira ecografia, o médico nos disse quanto ele/a media. E assim, o baby virou o Feijãozinho.

Após algum tempo, minha alma gêmea fez seus cálculos, leu livros, blogs, páginas médicas e chegou à conclusão que ele/a já havia crescido. Agora era a Azeitoninha. Na semana que vem faremos outra eco. Acho que já vamos poder chamar nosso/a filho/a de Tomatinho ou Batatinha, daquelas pequenas.

Estou doido para ver meu bebê nascer para vê-lo com tamanho de gente. Se bem que, se for depender da altura dos pais, acho que os sufixos para os apelidos dele/a vão continuar no diminutivo...

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Uma historinha pra você...


Papo besta. Eu sei que essa preocupação é inútil e o discurso pode cair no vazio. E você só vai me escutar quando tiver mais de 18 anos. Mas vai assim mesmo. Seu pai sempre gosta de contar histórias das coisas que ele viveu. Como da vez em que ele participou do Rally dos Sertões. Pode acreditar, foi uma experiência e tanto de vida. Quando eu puder, levo você para o interior, para conhecer uma galera muito diferente da cidade. Não sei se ainda existirão pessoas tão ingênuas quanto aquelas que conheci. Como um pequeno agricultor do Tocantins, que correu para dentro de casa, tirou filhos e mulher e saiu fugido ao ver um helicóptero chegando: "O passarão chegou para pegar a gente, mulher! Foge!".

Ou então uma senhora ainda em Goiás. Jacira era o nome dela, assim como o da sua bisavó. Ela fez questão de levar aquele bando de jornalistas para conhecer a casa dela. Era feita de barro, com telhado de sapé. E fogão a lenha. Tinha quatro cômodos: uma sala e três quartos. A cozinha e o banheiro eram do lado de fora. Na sala e nos quartos, a mesma mobília: dois tijolos que apoiavam uma tábua longa. Servia de cama e sofá.

Dona Jacira não parava de sorrir e contar como tinha conseguido sustentar os muitos filhos depois que o marido saiu de casa. Possuía umas galinhas, uma vaquinha, um boi, um bezerro. Ofereceu laranja pra todo mundo e não aceitou qualquer tipo de ajuda. "A gente consegue viver muito bem com o que a gente tem."

Me lembrou uma outra viagem que fiz para Cuba. Não sei se na sua época vai mudar, mas quando eu fui, o povo precisava de coisas como lápis, sabonete, caneta, pasta de dente. Uma brasileira ficou com pena quando uma mulher passou vendendo amendoim, que custava um dólar o saquinho. A brasileira deu dez dólares e falou que não queria troco. "Não quero esmola. Eu trabalho e quero ganhar por isso", falou a vendedora.

Não confunda isso com ingratidão, pouco caso ou desdém. Para quem tem todas as chances do mundo, e sempre teve, pode parecer. Para quem tem tudo desde que nasceu ou para quem não lembra o que já sofreu na vida, pode parecer. Mas não é. Isso é ter auto-estima alta, saber o que se vale. É saber a diferença entre pena e generosidade. É se dar o valor. Até que você cresça (sim, apesar da estatura do seu pai e da sua mãe, você vai crescer), espero que vários outros brasileiros tenham essa consciência. E que você seja gente em um país e em um mundo bem mais justo, bem mais humano. Sem hipocrasia, sem vãs esperanças.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Conselhos: ainda bem que não precisa pagar...



Seguinte: o blog é para ser cheio de sentimentos, mas risadas, caretices e azedices também fazem parte. E para começar com o melhor do mau humor, vamos aos conselhos recebidos até agora. Sim, os conselhos são muitos a partir do momento em que você sabe que terá um bebê. O primeiro deles foi: aproveite para dormir porque na hora em que o pimpolho vier, você não terá mais tempo. Ok, obrigado. Mas vem cá: vai adiantar eu dormir durante duas semanas seguidas agora? Tipo, quando o bebê nascer, vou poder lembrar daquelas duas semanas e aí o sono acaba? É retroativo?

Outra: não use calça jeans (obviamente essa é para a minha alma gêmea). Nossa, que prático! Como se não fosse algo natural, já que a barriga está crescendo e, claro, as calças jeans - ou qualquer outra calça apertada - machucam mais do que tudo. É como se dissessem: não deite em uma cama de pregos...

Mais: aproveite a gravidez porque depois você vai sentir falta. Esse conselho pode ser combinado com aquele "aproveite seu casamento porque agora vocês vão viver para os filhos". Então eu faço o quê? Como se a gravidez não fizesse parte do casamento ou como se a gravidez fosse algo como férias, que você tem que aproveitar todos os anos...

Já me disseram que, quando o bebê nascer, os conselhos vão multiplicar: dê banho desse jeito, coloque a fralda assim, saia muito com o nenê para ele criar anticorpos, não saia com o nenê para ele não ficar doente, não deixe ele/a com os avós porque vai ficar mimado/a, deixe ele/a com os avós para se acostumar com outras pessoas.

Eu sei: deixa-de-ser-mal-agradecido-as-pessoas-só-querem-ajudar. Tenho certeza disso. E realmente alguns conselhos vão ser essenciais para o bom andamento do processo. Aliás, em um aniversário de criança há alguns dias, eu tive um desses bons conselhos, vindo de uma mãe novata: não siga conselhos. Pode ter certeza de que algo que aconteceu com o filho dos outros vai acontecer com o seu, mas isso não é nenhuma garantia que a solução vai dar certo com você também...

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Medo? Insegurança? Felicidade?



Afinal, o que se sente quando você acaba de saber que será pai? Correndo o risco de ser acaciano, depende da situação que você vive no momento. Lembro de um amigo meu que se desesperou e imediatamente convenceu sua "companheira" de fazer um aborto. Outro ficou calado, com cara de quem está pensando em um coca-cola bem gelada. Eu, particularmente, tive que sair correndo da sala onde eu trabalho para chorar. Lembro perfeitamente do silêncio que eu e minha alma gêmea fizemos no telefone. Foi como se ela me abraçasse. Na boa, foi a única vez que chorei até agora - e lá se vão mais de dois meses. No resto do tempo, não tenho como mentir: fiquei preocupado. Eu sou um cara preocupado.


Mas queria ter certeza que aquela pequena cabeça de alfinete realmente estava viva, que eu não passaria pela frustração - na falta de uma palavra mais forte - de descobrir que a gente tinha perdido nosso filho. Por isso, semanas depois, quando ouvi o coração dela/dele pela primeira vez, eu não senti vontade de chorar. Foi um alívio imenso. Agora, toda vez que passo a mão pela barriga dela, toda vez que converso com aquele pequeno ser, toda vez que beijo aquela pele macia, sinto uma tranqüilidade imensa. É bom saber que ela/ele está ali. Não dá para dizer o que se sente quando você sabe que vai ser pai e dali por diante: são muitos sentimentos enviesados, embolados, intrincados. E é bom me sentir assim.